quarta-feira, 20 de agosto de 2008

O Espírito da Lei




Claramente, em Portugal, a lei é um sofisma e o estado de direito uma entidade virtual. O que realmente nos governa é o espírito da lei.


Por si só não seria grave, não se desse o caso de a lei mudar de estado de espírito. Pior ainda, por vezes, a lei até perde o espírito.


Assim, ao incauto cidadão, não basta conhecer a lei. E também não basta resolver os problemas de iliteracia de que tanto se tem falado para compreender a lei, e isto por dois motivos:
· o primeiro porque quem redige a lei padece dos mesmos problemas de iliteracia
· o segundo decorre deste: como ninguém entende a letra da lei, tem que se interpretar o espírito, e para isso, claro está, é preciso ser-se iniciado nessa arte ancestral de contactar o além.
É que a lei não é fornecida com espírito, e o espírito varia, varia muito, Oh se varia!....Varia com a cor política do governo, varia com o estatuto financeiro do cidadão, varia com os laços familiares existentes entre espírito e cidadão... varia, varia, varia....


Dá-se o caso que aqui há algum tempo, um amigo meu (o tal incauto cidadão), com a mania que tinha resolvido os problemas de iliteracia graças a uma colecção de canudos que tem algures nas gavetas, teve a ousadia de tentar legalizar um empreendimento nos termos da lei, sem consultar previamente qualquer espírito. Não percebo o espanto dele quando quase todos os pareceres institucionais recolhidos lhe eram desfavoráveis invocando o “espírito da lei”.


E vá de tentar perceber, no caso concreto, qual era afinal o espírito da lei.


A iniciativa estava condenada à partida pelo facto de se desenrolar em pleno período de férias; como se sabe, nesta altura do ano, todos os organismos da administração pública mantêm-se em funcionamento só que, vá-se lá saber porquê!, nenhum funciona. De secretaria de estado para direcção geral, de direcção geral para direcção regional, de direcção regional de novo para secretaria de estado, da telefonista do serviço geral para a telefonista do serviço de relações públicas, desta para a telefonista do sub-secretário do secretário do chefe de divisão do director geral, que devolve a chamada à secretária da directora de serviços do sub-director geral, e esta sim, conhecia um iniciado que o poderia iniciar no entendimento do sobrenatural. E devolveu a chamada à telefonista do serviço geral que a passou à secretária deste Messias.


Azar do meu amigo: a criatura estava em reunião. No dia seguinte às 10.30 h ainda não tinha chegado e às 11.15 já tinha saído para almoço. Às 15.10h ainda não tinha chegado do almoço e às 15.30h já tinha saído em serviço externo, onde permaneceu o resto da semana.


E foi graças à telefonista da secretária (com o auscultador exausto e as orelhas exangues) que o Esperado telefonou ao meu amigo. Então, vem-se a descobrir que afinal este iniciado não era especialista em contactar aquele espírito. Dá-se o caso que com a saída do anterior Governo saiu também para parte incerta o iniciado no espírito da lei em causa. E assim aquela lei perdeu o espírito!


Mas a administração pública não se atrapalha...assim, cada instituição, cada departamento, cada técnico, cada telefonista dá tratos à imaginação para de novo dotar de espírito a pobre lei, que já vivia, coitada! num sindroma de profunda orfandade. Valha-nos isso.


Só assim se compreende que quatro instituições diferentes invoquem para a mesma lei quatro espíritos antagónicos.


Desabafava o meu amigo, após esta experiência transcendental, que para que esta relação entre estado e cidadão não se transformasse num contrato leonino, como dizia o Eça, deveria ser assegurado aos cidadãos evocar o espírito dos seus actos quando praticados contra a lei. É por isso que não faz sentido nenhum que o Sr Vale e Azevedo tenha sido preso por burlar o Benfica: o espírito dele sempre foi o de devolver ao clube o dinheiro que tinha depositado nas suas contas. E já agora, por essas e por outras, não se atreva o estado a acusar alguém impunemente de fugir aos pagamentos ao fisco ou à segurança social, sob pena de o arguido atirar um espírito qualquer à cara do Ministério Público.


Este meu amigo sempre se considerou descendente directo da Padeira de Aljubarrota; sempre clamou que Olivença é nossa; é capaz de comprar uma caixa inteira de pêssegos podres portugueses mas não compra um luzidio pêssego espanhol; passou o mês de férias à procura do polícia espanhol que deu a bofetada no Francisco Louçã para lha devolver com juros e custas, mas jura que se em Espanha não se governarem pelo espírito das leis, ele quer ser espanhol.

1 comentário:

Anónimo disse...

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